O MacGuffin: Deixemo-nos de tretas

segunda-feira, junho 13, 2005

Deixemo-nos de tretas

Oiço Guterres, o ex-engenheiro (?), afirmar, perante as câmaras (arrisco a paráfrase), que Cunhal foi um homem de «grande coerência» e de «convicções», como tal deve por todos ser «respeitado». Não há pior elogio fúnebre que o elogio idiota e inconsequente. Cunhal foi «coerente» e «convicto». E depois? Salvo as devidas proporções, Hitler foi coerente e convicto. Saloth Sar, mais conhecido por Pol Pot, também. Mao Tse Tung aussi. Estaline, então, nem se fala. Cunhal foi um homem coerente mas foi-o, quase sempre, pelas piores razões. É óbvio que foi uma figura «incontornável» da segunda metade do século XX português. Lamento a sua morte na exacta medida em que lamento a morte de qualquer ser humano. Fora isso, seria conveniente não aproveitar a oportunidade para branquear a História. Uma História que, por exemplo, Soares bem conhece. Uma história que Pacheco Pereira tratou de contar. Cunhal ficou muito aquém da figura benigna e simpática do velhinho idealista que toda a vida lutou pelos mais nobres ideais: da liberdade, da tolerância, da democracia, da justiça social. Cunhal foi um homem duro, implacável, maniqueísta e dogmático. Um homem que se deixou ultrapassar pela vida e pelo mundo, agarrado aos seus paradigmas e aos seus inúmeros fantasmas. Viveu amargurado os últimos anos da sua vida, gerindo mal a frustração de um «amanhã» nunca concretizado.

Para além da retórica desculpabilizante e indulgente das «boas intenções» e dos «melhores fins» - de que o mundo, como se sabe, está cheio, e que vem sempre à baila quando se fala do comunismo - Álvaro Cunhal lutou pela «sua» ideia de liberdade e pelo «seu» modelo «democrático». Apraz-me concluir que os seus ideais não vingaram em Portugal. Paz à sua alma.

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